A formação sociodiscursiva política kyikatejê: uma análise do ethos do cacique no interdiscurso nativo
Ethos; Cacique; Kyiketejê
Nesta pesquisa, pretende-se capturar os ethos – em termos foucaultianos, as funções subjetivas na forma da exterioridade (Foucault, 2014; 2019; 2023) – engendrados pelo sujeito da enunciação Jakukreikapiti Ronoré Konxarti Pepkrakte, o qual transita no lugar enunciativo-discursivo cacique, no interior da exterioridade da formação discursiva política kyikatejê. Para tanto, utiliza-se, sobretudo, o quadro epistemológico desenvolvido por Michel Foucault ao longo de quatro obras, quais sejam: As palavras e as coisas (2016), A arqueologia do saber (2019), A ordem do discurso (2014) e A hermenêutica do sujeito (2010). De modo extremamente lato, o que esses trabalhos têm em comum é o fato de pressuporem que os fenômenos relacionados ao homem sejam analisados por meio de um princípio de inversão (Foucault, 2014, p. 49), na forma da exterioridade (Foucault, 2014, 2019) e na forma do a priori histórico (Foucault, 2016, 2019), isto é, que os fenômenos relacionados ao homem sejam analisados como necessariamente imanentes à escansão histórica do arquivo (Foucault, 2019). Aventamos, com efeito, aqui, este meandro proposicional mais especificamente da seguinte forma: primeiramente, entende-se que, no interior da exterioridade do arquivo nativo kyikatejê, há positividades (Foucault, 2014; 2016; 2019; 2019c); em segundo lugar, entende-se que estas últimas ganham contorno institucional – em termos mais diretamente foucaultianos, um acúmulo – por meio de arranjos entre duas ou mais formações discursivas (Foucault, 2019); depois, entende-se que, na figura do arranjo das formações discursivas, há posições subjetivas (Foucault, 2014, 2019) que podem ser assumidas por diferentes indivíduos, sob certas condições estatutárias definidas pelas descontinuidades históricas. Em outras palavras, há um continuum positividades, formações discursivas e posição subjetiva: sendo as primeiras o a priori histórico; as segundas, a materialização sociodiscursiva desse a priori; e a terceira, um lugar enunciativo para o indivíduo declarar-se como sujeito do seu discurso. Ademais – e tomando como arquitetura conceitual e metodológica também as obras Novas tendências em análise do discurso (1997) e Variações sobre o ethos (2020), ambas de Dominique Maingueneau –, concebe-se, nas análises do discurso aqui realizadas, o sujeito do enunciado foucaultiano como um conjunto de ethos engendrado e assumido pelo sujeito da enunciação no momento da formulação de seu discurso, no interior da exterioridade de um arranjo interdiscursivo. Consequentemente, esse quadro teórico é aplicado da seguinte maneira: a positividade discursiva que está sob o escopo de nossa análise é o interdiscurso político nativo do povo indígena Kyikatejê; as formações discursivas que materializam e engendram esse discurso são a tradição (discurso ancião), a escola nativa (discurso escolar) e, principalmente, o espaço político (discurso político nativo); e, finalmente, no interior da exterioridade dessa malha sociodiscursiva, escandida por esses sistemas de formação, são dispersados os ethos nos quais Jakukreikapiti Ronoré Konxarti Pepkrakte transita, por intermédio da exterioridade subjetiva cacique.